No anais da Régie Nationale, a marca francesa do diamante nascida do tino de três irmãos, estão preciosos registros da história do motorsport.
Como o italiano, o alemão e o americano, a turma da baguette e do cointreau adorava velocidade. Nas pistas, as marcas da casa criaram maravilhas mecânicas e grandes ídolos, embora as vitórias talvez sejam detalhe na trajetória de ambição e pioneirismos dos franceses, sobretudo da tradicional Renault.
E entre estes quadros e anais marcantes, há nomes que se distinguem portanto. O Alpine que arrematou Le Mans nos anos 1970, os feitos do jovem Alain Prost, o pequeno notável turbinado de Jean Ragnotti, os motores que levaram a Williams a excelência tecnológica em um pacote invencível, o bólido azul Mild Seven que fez de Fernando Alonso um gigante… e, claro, Jean-Pierre Jabouille.
Este francês de feição curiosa, nascido sob a sombra dos “quatro mosqueteiros” da F-2 (ele, Michel Leclére, René Arnoux e Patrick Tambay) é um daqueles caras que não é possível dissociar sua imagem da casa onde militou. Tão importante numa época produtiva do automobilismo francês, Jabouille era um velocista que serviu a uma destas causas pioneiras a qual falamos vindas de Paris. Uma aventura, diga-se.
Quando tudo era mato, a França queria vencer por si e apenas por si. E o franzino e rápido francês tornou-se o mais servil funcionário da Régie na mais ousada das aventuras: o turbo. O preço do pioneirismo na longa história do diamante na categoria teria de ser pago por alguém, e talvez a Renault escolheu o melhor para isso.
Jean-Pierre, nascido na cidade-luz e tão sonhador com as glórias iguais as de Maurice Trintignant ou os feitos de Beltoise e Pescarolo, embarcou no barco e comeu o pão amassado pela marca e seu preço pioneiro: quebras, não-classificações, decepções… e a vitória. Tão pouco alcançada por ele, mas sendo uma delas, divisor de águas para uma tecnologia e para a marca que defendia.
Jabouille virou quase que sinônimo da Renault. O fiel funcionário que pagou os deméritos da aventura e sofreu com os azares que tinha, o complexo de Chris Amon que acomete alguns. Mesmo assim, mostrou trabalho, foi um dos grandes no tempo do risco e venceu, mesmo que por duas vezes, mas aquele em Dijon (1979) talvez só seja esquecida por quem não estava olhando a linha de chegada.
No mordaz duelo de seu companheiro de esquadra – Rene Arnoux – com Gilles Villeneuve e suas acrobacias ousadas, a enlouquecida torcida francesa talvez não percebeu que o Jean-Pierre, um dos “quatro mosqueteiros”, realizava o sonho que Jacques Laffite e Guy Ligier não conseguiram, a sanha de todo engenheiro francês: ganhar com um “puro sangue” na pista: carro, motor, pneu, combustível e piloto franceses.
E não só: na mão de Jabouille que se provou, por tanto, que era possível vencer com o turbo, embora ainda havia um longo caminho a percorrer com foice e enxada num mato denso.
Era a marca do pioneirismo, mas para o piloto restaram os azares, pernas quebradas e uma carreira curta, pequena comparada aos grandes, mas vitoriosa sob o aspecto da aventura, da deterninação de levar a fábrica donde era operário padrão a realização.
Depois da F1, chegou até a emprestar a mesma expertise aos rivais da Peugeot, sendo igualmente vitorioso nos protótipos mas comendo o mesmo pão dos anos 1970 nos motores da então F1 em uma explosão tecnológica.
Mesmo com o leão no peito, Jabouille era, de fato, o cara do diamante, um grande que tem seu lugar na história pelo ímpeto da aventura, e levando consigo a estrela de uma palavra que diz muito para quem pilota, sobretudo na França dos determinados: “pioneiro”.
Merci, Jean-Pierre!