DNQ#8: Documento Ímola, um autódromo de muita história na F1 (parte 2)

Olá Amigos do G&M! o DNQ está de volta e bem rápido!

Depois da primeira parte, onde você foi apresentado ao então Autódromo Dino Ferrari, hoje começamos com os momentos incríveis e históricos que Ímola proporciona ano após ano na F1. E isso me impressiona, pois é o realmente o único autódromo atual na categoria em que todas as provas tem histórias para contar e que marcaram a categoria de formas boas e infelizmente, trágicas.

Mas, eu não esqueci da rotina DNQ! E o nosso homenageado de hoje na primeira sessão de pré-qualify em 1989 é o que ficou mais perto de passar para os treinos oficiais na etapa brasileira: Alex Caffi.

Alex Caffi teria trabalho, no começo do ano, com o novo modelo F189

Após um início com um carro adaptado e melhorias que levaram ao menos a equipe a participar das provas em 1988 com constância, Gianpaollo Dallara e Mario Tolentino trouxeram um bólido mais convencional para Alex Caffi e Andrea de Cesaris em 1989.

Nesta primeira prova Caffi era um dos favoritos a passar para a o treino oficial, mas acabou ficando fora devido a uma quebra do motor Ford DFV, adiando a estreia dos dois Dallara no grid (Andrea de Cesaris já tinha lugar garantido no grid). Com isso, Caffi marcou antes da quebra 1:30.747, ficando a 5,5s da pole de Ayrton Senna e sendo 31º colocado geral (5º na sessão de pré-qualificação).

Rotina mantida, vamos mergulhar em tudo que aconteceu em Ímola desde 1980, quando ocorreu a primeira prova valendo pelo campeonato mundial da F1. Para facilitar a absorção de todos do material, o formato será em tópicos, dividindo as décadas em duas partes (anos 1980, com parte 1 de 1980 a 1984 e parte 2 de 1985 a 1989), depois anos 90 (parte 3, de 1990 a 1994, e parte 4, de 1995 a 1999), anos 2000 (parte 5, de 2000 a 2006), e finalizando com o retorno em 2021 e 2022.

Hora de mergulhar na história!


1980 – Estréia com batismo de curva

Data: 14/09/1980
Prova: 60 voltas, cada uma com 5.000 km;
Pole: René Arnoux (Renault)
Vitória: Nelson Piquet (Brabham-Ford)

História para contar: A história desse GP começa sendo este o único GP da Itália realizado fora de Monza. A pista tradicional passava por uma reforma severa, motivada principalmente pela morte de Ronnie Peterson em 1978, e a consequente pressão por mais segurança no traçado. Durante a sexta feira um desastre de helicóptero feriu cinco pessoas, dentre elas dois mecânicos da Alfa Romeo que estavam indo para a pista. Outras três pessoas foram atingidas pela cauda do aparelho em solo.

Outra: você certamente lembra de Nelson Piquet trocando socos com Elizeo Salazar certo? Pois neste fim de semana em Ímola, o brasileiro também trocou socos com um bandeirinha que pedia de forma acintosa que ele voltasse para a pista ao sair do traçado na Acqua Minerale. Motivo dos tapas? O bandeirinha CHUTOU os pneus do Brabham e foi ao cockpit cobrar o piloto para voltar logo a pista.

Além disso tudo, uma curva foi batizada nesse fim de semana. Aparentemente, após um estouro de pneu traseiro, Gilles Villeneuve estampou o 312T5 (modelo evoluído do campeão de 1979 e muito ruim) no guard-rail da viragem antes da Tosa, com isso batizando aquela simples curva impressa com o carimbo do “Vilanova” na F1: a curva Villeneuve!

Villeneuve saindo milagrosamente do 312T5 após o acidente que batizou a curva com seu sobrenome

1981 – A briga FISA x FOCA

Data: 03/05/1981
Prova: 60 voltas, cada uma com 5.000 km;
Pole: Gilles Villeneuve (Ferrari)
Vitória: Nelson Piquet (Brabham-Ford)

História para contar: A prova de Ímola chegava na sua data que seria tradicional, no inicio de Maio e teria pela primeira vez a nomenclatura conhecida: I Grande Prêmio de San Marino, utilizando-se do nome da minúscula república encravada na península itálica.

O clima nos boxes era bélico: Colin Chapman retirou a Lotus da Prova após a FIA não autorizar (outra vez) o uso do polêmico modelo 88. Foi o inicio da terrível crise FISA X FOCA, o que levou Elio de Angelis falar aos repórteres que não entende o porquê da proibição se o Brabham é claramente ilegal. “Queria entender também porque todos tem medo de Bernie Ecclestone”, dizia ele. Pra tirar o príncipe negro do sério, tinha que ser algo muito intenso.

Em dado momento dos treinos, apenas as equipes FISA eram liberadas a pista. Além de tudo isso, Bernie Ecclestone trouxe a fornecedora de pneus da marca Avon na categoria e acabou com o monopólio Michelin, sendo a Fittipaldi a única a ter a borracha inglesa nos seus carros (pneus muito ruins, diga-se). Era o estopim do que explodiria em 1982.

Nessa prova, estreava na categoria a combinação Toleman-Hart, que neste fim de semana não conseguiria classificação com Derek Warwick e Brian Henton, e também da estreia de um piloto que teve grandes momentos na década de 1980: o “marocchino” Michele Alboreto. Além disso, a prova foi cheia de marcas numéricas “redondas” : 140ª vitória da Cosworth, 90ª pole da Ferrari, 90ª melhor volta da Ferrari e 50ª prova da Renault na categoria.

Com apoio literalmente local, o “marroquino” Michele Alboreto estreia na F1 em 1981.

1982: O último ato de Gilles Villeneuve

Data: 25/04/1982
Prova: 60 voltas, cada uma com 5.000 km;
Pole: René Arnoux (Renault)
Vitória: Didier Pironi (Ferrari)

História para contar: Certamente, a prova de 1982 é uma das passagens mais marcantes da F1. O final de semana começou com a guerra FISA X FOCA, iniciada em 1981, tendo um dos seus momentos esportivos mais tensos: as equipes do grupo da FOCA: Brabham, Williams, Mclaren, Lotus, Ensign, March, Fittipaldi, Ligier, Arrows e Theodore confirmaram que não participariam da prova.

Enquanto isso os times “de fábrica” – nomeadamente Ferrari, Renault, Alfa Romeo – alinharam-se à FISA, com a adição de Tyrrell, Osella, ATS e Toleman, formando o grupo chamado “legalista”. No entanto, estas últimas romperam o bloqueio à corrida, citando “obrigações com os patrocinadores”.

Para explicar, a Tyrrell tinha o aporte da marca de eletros Candy e da Cerâmica Imola, ambas italianas. A Osella era puramente italiana, a Toleman também era patrocinada pelos italianos da Candy e a ATS estava se desligando da FOCA. Assim, a corrida foi considerada como válida, com o grid sendo formado com 14 carros.

Com isso a prova se desenhava para Renault e Ferrari. No entanto, a Renault sofria com seus persistentes problemas mecânicos, sobrando para a Ferrari o domínio da prova. E nesse momento, acontece uma das maiores batalhas da história da categoria: o encontro de dois amigos em pista, dois companheiros de equipe, Didier Pironi e Gilles Villeneuve, prendendo a respiração dos tifosi nas arquibancadas e barrancos de Imola.

Com a corrida na mão, não precisando correr riscos como colisão, quebra ou falta de combustível, a Ferrari exigiu que seus pilotos mantivessem as posições (então Villeneuve P1 e Pironi P2) com o intuito de garantir a primeira dobradinha em casa desde a prova de Monza, em 1979. Para Villeneuve era a coroação em frente aos tifosi, mas Pironi desobedeceu a ordem e ultrapassou seu companheiro de equipe quase que inesperadamente, e o francês venceu a primeira corrida pela equipe italiana.

Villeneuve x Pironi: a última vez que veríamos isso.

Furioso, Villeneuve chamou Pironi de traidor e a expressão mal-humorada do canadense no pódio era prova de que as coisas não iam (ou não iriam) bem. Logo após a prova, Villeneuve soltou o grito de raiva: “nunca mais falarei com Pironi na minha vida”. algo que se tornou brutalmente real com a morte de Villeneuve nos treinos para a corrida seguinte, na Bélgica.

Para o Brasil, um momento marcante: sem nenhum brasileiro, o grid dessa prova acabou sendo a última sem pilotos da terra até o problema de saúde de Felipe Massa, no GP da Hungria de 2017.


1983: Um italiano bate na liderança, a Itália entra em festa!

Data: 01/05/1983
Prova: 60 voltas, cada uma com 5.000 km;
Pole: René Arnoux (Ferrari)
Vitória: Patrick Tambay (Ferrari)

História para contar: Sim, o paragrafo não está errado! 1983 (que aliás foi retratado a poucos dias aqui no G&M Corridas clássicas) trouxe aos fãs do automobilismo uma das maiores provas do tamanho e importância da Scuderia Ferrari para os italianos, independente de que país seja o bota que está conduzindo um dos míticos bólidos do comendador.

A história foi escrita de forma quase mágica, mas o fim de semana em Ímola começava movimentado, com Gerard Ducarouge demitido da Alfa Romeo e a caminho da Lotus. A Cosworth entregou novos engenhos DFY a algumas equipes, com críticas ostensivas de Niki Lauda, que não viu absolutamente nenhum ganho de potência no modelo.

A Osella ganharia o trem traseiro inteiro do Alfa 182 de 1982. Não quer dizer que isso desse alguma vantagem para a equipe italiana, tanto que Piercarlo Ghinzani nem se classificou a prova enquanto Corrado Fabi, empurrado pelo fiável Cosworth se garantiu para a prova (de último, mas estava lá).

Um italiano em um carro inglês, em um circuito italiano, bate. A festa da torcida é enorme, pois a vitória fica para um francês numa Ferrari.

No dia da prova, a vitória estava na mão de Riccardo Patrese na inglesa Brabham. Isso após ultrapassar a Ferrari de René Arnoux. Porém, na saída da Acqua Minerale, o garoto-Parmalat e o carro inglês acabaram saindo reto e batendo nos pneus, o que causou uma verdadeira explosão de comemoração no circuito.

René Arnoux, francês num carro italiano, iria assumir a liderança mas acabou rodando pouco depois. A ponta caiu no colo de Patrick Tambay, outro francês da casa de Maranello, e isso era o que importava. Uma Ferrari numero 27, no GP de numero 350 da historia rossa na F1, vencia a corrida em uma Ímola absolutamente abarrotada, num delírio coletivo que deixaria Riccardo Patrese, um italiano, com uma mágoa imensa que levaria alguns anos para ser cicatrizada.


1984 –  O inicio torto de uma história inesquecível

Data: 06/05/1983
Prova: 60 voltas, cada uma com 5.040 km;
Pole: Nelson Piquet (Brabham-BMW)
Vitória: Alain Prost (McLaren-TAG Porsche)

História para contar: Em 1984, Ímola registrava um fato curioso e, igualmente, marcante para a F1.  O dia 05 de maio de 1984 marcou a única vez numa história de 162 GPs inscritos, que Ayrton Senna não se classificou para uma largada na F1. Um emaranhado de situações que começaram na sexta-feira, passando por questões internas na Toleman: pneus, motores, nada deu certo naquele fim de semana para o então estreante brasileiro na temporada.

O fim de semana começou emotivo em Ímola, com Patrick Tambay homenageado pela vitória épica de 1983, recebendo o troféu Gilles Villeneuve como marca única daquela vitória numa Ferrari #27. Ele já emprestava seus serviços para uma Renault que não lhe permitiu nada mais que o meio do grid, testemunhando a olho nu toda a idolatria de Enzo Ferrari à Michelle Alboreto, que chegou a ser comparado a Alberto Ascari pelo comendador.

Nesse fim de semana também estreava uma figura conhecida da leva austríaca que chegava na esteira de Niki Lauda à F1: Jo Gartner recebia o segundo carro da Osella com motor Alfa Romeo, um modelo do ano anterior, e deu a sorte de Piercarlo Ghinzani não conseguir se classificar o carro principal da equipe do Piemonte.

Detalhe: Antes dominantes, os Cosworth estavam em apenas três dos 28 inscritos. Dois DFY na Tyrrell e um solitário DFV para Thierry Boutsen na Arrows (o outro carro da equipe, com Marc Surer, estava de BMW Turbo). A era turbo chegava de forma definitiva na F1.

05 de maio de 1984: o único DNQ de Ayrton Senna na sua carreira na F1

Mas a grande história do fim de semana estava na pequenina casa britânica. A Toleman tinha testado o novíssimo TG184 em Zolder, carro que Senna descobrira pronto na fábrica e que a equipe não queria revelar a ele por não ter um segundo carro em condições para Johnny Cecotto, o companheiro de equipe. Com isso, a trupe desembarca em Ímola com o já antiquado TG183B.

Para completar, Ayrton vinha reclamando insistentemente do desempenho dos pneus Pirelli. Além dessa cobrança, Ted Toleman e Alex Hawkrige tinham outra situação pendente: cobravam dos italianos o reembolso dos testes da equipe em Zolder, algo em torno de US$ 250 mil dólares da Pirelli.

Tudo isso estourou na sexta, a Toleman não saiu das garagens enquanto Bernie Ecclestone negociava com as partes um acordo, que acabou saindo para esse GP. Enquanto isso, o velho Ted assina com a Michelin para o restante do campeonato, e a Toleman deu um salto de qualidade, deixando a Pirelli apenas com equipes de fundo de grid, como Osella, RAM e Spirit.

Eis que chove na sexta e o tempos nos treinos ficam altos. No sábado, a pista começa molhada no treino oficial e vai secando. Era o golpe de misericórdia em Senna: o motor Hart quebra (problemas de alimentação de combustível) e resta apenas a última posição no treino de sábado, ficando fora de uma corrida de F1 pela primeira e única vez na carreira.

Com a prova de 1984, terminamos a segunda parte da história de Ímola. Participem conosco, mandem suas visões, seus comentários e ao acabar aqui migrem para a parte 3, onde estaremos entre 1985 e 1989.

Abraços a todos!

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