Herr Zakowski

O alemão, antes de Schumacher, era um exaustivo perseguidor da glória máxima da F1. E talvez, por tanto tentar, em algum momento pensou que jamais chegaria lá na mão de terceiros, mas colocando na pista a própria técnica inventiva na produção dos mais incríveis carros de corrida, motores e engenheiros.

Não a toa, a gente olha em volta e as retinas brilham com as obras da arte mecânica nascidas no solo germânico: a veloz BMW e a mão de Paul Rosche, a vitoriosa Porsche e a batuta de Hans Mezger, a ousadia da ATS de Gunther Schmidt e seu trabalho pioneiro em fibra de carbono, o turbo da KKK e isto só para não citar nomes que, de uma forma ou de outra, levavam a tricolor preta-vermelha-amarela à vitória em várias pontas, mesmo que a categoria-rainha fosse um olimpo complicado e frustrante.

E para qualquer fã superficial, falar das grandes marcas é fácil, já que a tradição delas contava e muito na balança na hora de representar a engenharia alemã pelo mundo. Mas havia uma mente que era o puro suco do self-made-man do esporte a motor, pois com ele ainda resistia um terreno praticamente extinto da técnica do motorsport atual: construir uma equipe de ponta-a-ponta, incluindo o caríssimo e complexo motor.

O belíssimo Ford Capri MkIII nos tempos do DRM: vitórias, prestígio e o representante oficial do oval americano na Alemanha

A ambição de Erich Zakowski ia muito além do sucesso que colhia com os poderosos Ford Capri MkIII do Deutsche Rennsport Meisterschaft (DRM). Aquela besta-fera do oval americano e de sangue europeu, palanque para gente do naipe de um certo Klaus Ludwig, era só uma das obras que o construtor filho da Prússia Oriental era capaz de fazer.

Ele era o cartaz-maior da Ford no seu país, atacando do Grupo 5 ao WSC. Mas Zakowski, seus fios brancos e a clássica teimosia alemã, foi além e resolveu incorporar a essência do velho racer sedento de levar a inventividade do país a outro patamar. Um bom time de profissionais, conhecimento técnico e o plano: não só carro, mas fazer um motor próprio para o degrau da F1.

Maluco? Talvez quisesse provar que pode se fazer o melhor tendo tudo em casa, coisa que a Alemanha tinha de sobra como vimos acima. Só que esse degrau da F1 é mais cruel com páginas ousadas e de ambições, as parando no abismo financeiro e técnico entre umas e outras. Erich tentou, teve pilotos de nível até razoável e uma estrutura organizada e profissional, mas o sonho de vencer pelas próprias pernas era uma miragem, uma ilusão, o “murro em ponta de faca”.

No primeiro ano de F1: 1985, com Dr. Jonathan Palmer no cockpit e aprendizados duros
Ao lado de um jovem Bernd Schneider. Nos primeiros passos da lenda do DTM, uma passagem pela casa de Erich, apesar das dificuldades
Aguri Suzuki e o 891, último carro da equipe na F1: motores Yamaha e novos fracassos. Era o fim da aventura

Foi-se dos motores próprios à uma parceria com a japonesa Yamaha, que não fazia veículos mas tinha peito para encarar um motor de competição em quatro rodas. Não deu. A crueza de não-classificações e fracassos matou sua ambição mas não seu lado racer. Zakowski continuou sendo um sobrenome de peso mundo afora, ainda mais dentro de casa, onde Mercedes/Opels amarelos eram algumas das forças reinantes no então pujante DTM.

Erich foi um destes raros e extintos puro-racers que surgem, tentam e, se não vencem, somem mas deixando a marca da persistência muito acima das críticas vazias, Nem sempre a vitória signifique a realização do sonho, mas o competir jogando no tabuleiro a sua própria inventividade seja o maior prêmio de um sobrenome e uma marca das mais indeléveis de um áureo tempo do automobilismo.

Herr Zakowski nos deixou no inicio de novembro, aos 89 anos de idade, mas deixando conosco recheadas lembranças de um alemão que, entre tantos (e talvez mais poderosos), quis deixar a marca que o país tem até hoje, forte e pujante: tecnologia e força nas pistas, seja ela na mesa dos engenheiros ou no braço dos pilotos.

E os que teimam em fazê-lo pelas próprias pernas merecem palmas! Erich foi grande, e os que dão valor ainda vem seu invocado Ford Capri cruzar as curvas de Nurburgring em um voo silencioso na eternidade poética do esporte a motor.

Danke für alles, Herr Zakowski…

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