Entre tantos momentos tornados históricos depois da última bandeirada alucinada de Glen Dix em Adelaide, aquela tarde de 1993 quase que deixava passar o último ato de um velho lobo dos grids. Discreto num nono lugar, o italiano deixava a Benetton no parc fermé, tirava o capacete e talvez, com um suspiro aliviado, dizia para si mesmo: “é o fim”.
Italiano de Pádua, à época com 39 anos de idade e 16 de F1 nas costas, Riccardo Gabriele Patrese dançava o último bale em terras australianas. A temporada talvez não foi aquilo que esperava depois de sair, quase que pela porta dos fundos, da gloriosa Williams para se juntar ao time colorido da marca de roupas.
Os 20 pontos na tábua, sendo destes dois pódios (terceiro em Silverstone e segundo em Hungaroring) eram nada de nada para um sujeito aparentemente cansado que tomara uma surra homérica do jovem alemão de queixo afilado que se candidatava a estrela do circo pelo terceiro ano seguido. Quem ousasse confrontar Schumacher era moído, Patrese foi um destes tantos.
Mas, estas linhas não se atrevem a contar, em detalhes e números, a história deste italiano que vagou pela categoria como um jovem homem prestativo sem ser brilhante. Recentemente, a questão da longevidade no grid foi pauta entre os amigos do grupo. Mesmo que Fernando Alonso seja um puro exemplo de vitalidade e velocidade aos 42 longos anos, olhar para trás no tempo nos traz a sombra de Riccardo, talvez o primeiro longevo das pistas que os puristas e estudiosos lembram fortemente.
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Talvez Patrese nunca tenha tido tutano para ser um campeão, mas carregava algum atrevimento no seu metier desde as primeiras divididas nas pistas da categoria-mãe, e isso em tempos de Cosworth em mais de meio-grid, perigo constante e romantismo misturado ao “sexo, drogas e Rock ‘n Roll” setentista. Uma temporada de adaptação na Shadow, em 1977, foi quase o suficiente para, no ano seguinte, assombrar a categoria com algumas atuações combativas na novata Arrows. Enquanto a dissidente lhe deu carro, não faltou ímpeto para pontos e um segundo lugar na Suécia.
Pois seria, talvez, a mão pesada do destino e da culpabilidade na morte de Ronnie Peterson o que lhe tirou o brilho de um futuro campeão? Riccardo era veloz, fato, mas depois daquela tarde em Monza, nada mais lhe foi tão impetuoso como outrora, e aquela faceta de promissor deu lugar a marca que carregou por anos: a prestatividade alternada a performances ora fortes, ora comuns ou insignificantes.
Como dissera, não era brilhante, mas era eficiente e dava seus pulos vez em quando. Depois da Arrows, o período de vacas razoavelmente gordas como secundário da Brabham e protegido da Parmalat. O time de Bernie, Piquet e Gordon o viu vencer a primeira vez na insanidade monegasca de 1982, mas nada que apenas alguns brilharecos e demonstrações de um bom operário-padrão para o time.
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Ele voltaria à Chessington em 1986 depois de dois anos com o pior carro que já dirigiu: a Alfa Romeo de últimos respiros. Isto que, ao mesmo tempo que estava na F1, dividia seu tempo com os Lancia do Grupo C e tinha momentos competitivos junto de gente do quilate de “Briliant” Bob Wollek, Mauro Baldi e outros. Seria em Grove, no entanto, que Patrese viveria tempos de projeção maior, mesmo não sendo o ideal para Tio Frank naquele período, mas o necessário para reconduzir um time aos trilhos no início da estada dos franceses da Renault.
O currículo, de duas vitórias apenas, saltou para seis. Tentos vencidos com algum destaque, mostrando a velha técnica que o fez assombrar o grid no já distante 1978. No entanto, era uma Williams que tinha um Mansell impossível e brincando como queria em casa, e o Leão mandava, desmandava, pintava o sete e sambava diante um simples e probo Riccardo. A ida para a Benetton era a continuação de uma trajetória que, se não alegrava em resultados, enchia os olhos dos curiosos desde quando batera os 200 GPs, numa ensolarada Silverstone, com bolo e brincadeiras dos colegas de grid.
Aquela tarde de 1993 talvez não tenha tido a mínima gratidão com o italiano que conhecia o ambiente como quem conhece o setor onde trabalha, do banheiro a máquina do café e a pessoa da faxina. Para o topo das estatística, talvez Patrese não serviria, dada uma vida mais prestativa do que combativa, mas 256 GPs foi um número mágico que, por anos e anos, perambulou a mente de quem falava em longevidade no grid: é possível bater este número?
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Rubens Barrichello foi o primeiro a ultrapassa-lo, vindo outros tantos e sendo o mesmo Alonso, que sonha em ser tri aos 40 e tantos, o ponteiro atual desta estatística. A longevidade de largadas e participações se conta, hoje, aos 300 para cima, mas Riccardo ainda é uma espécie de referencia entre tantos. Atravessou eras fabulosas da categoria como um coadjuvante de luxo que, vez em quando, aprontava e levava prêmios e troféus para a prateleira de casa como uma lembrança brilhante destas pelejas entre gênios, turbos e aspirados.
É comum pensar em Patrese quando falamos desta incessante vontade de correr, aquela que parece não ter fim e não conta idade em número. A diferença é que, entre tantos estes a sua frente, Riccardo não pensou mais em voltar a grelha. Matou saudades com alguns bólidos depois de 1993, mas seu capacete icônico em branco e faixas azuis ficou apenas no imaginário de quem, constantemente, acostumara-se com a presença dele entre os moços tão mais jovens que ele dividindo curva.
Saúde, preparo físico, biologia, aspectos que podem entrar no lance nesta seara, mas histórias escritas num período como aquele, transcendental entre décadas, tecnologia e momentos, talvez só mesmo Patrese para tê-los, e essa marca e os 256 tentos ninguém mais tira dele, o primeiro “vovô” do grid, com respeito e com palmas até hoje.