A voz marcante…
Alcunha profunda, daquelas cuja outorga dada pelo público e pela profissão já é um troféu por si só. E quem diz isto não é apenas eu, mas meus pais, tios, avós, aqueles que já pereceram pelo caminho e se acostumaram a ligar o moço de Cordeirópolis ao esporte em todas as modalidades.
Ainda lembro de ouvir, em entrevista, o velho Léo recordar a ordem recebida do saudoso Júlio de Lammare, um dos pioneiros maiores do jornalismo esportivo para a TV: “você será meu locutor de esportes ‘amadores'”, referindo-se ao além do que era o futebol puro e simples que se praticava e contava naqueles tempos.
Dali então, ouvir a animação caracteristica e a forma única de narrar – ao vivo ou no resumo do dia – um gol ou um fato esportivo passou a ter a caracteristica impressa por ele. Léo Batista atravessou gerações reimprimindo a mesma marca vocal nos feitos desportivos do país e do mundo, com aquele entusiasmo simples de quem via o lance pela vez primeira, como a gente.
Quem atravessou 55 anos dentro dos corredores da Globo, entre chegadas e partidas, mudanças nos conceitos e aventuras a perder de vista, sabe que registrar tudo que foi vivido por Léo é impossível até mesmo para a casa dos Marinho. A nós do G&M, a lembrança mais latente, claro, é do automobilismo cuja primeira voz na TV foi a dele, em tempo que Emerson Fittipaldi ainda vencia e a F1 levava uma vida ou duas por temporada.
Sei bem que a criação do Sinal Verde teve a batuta e criatividade de Reginaldo Leme, mas ouvi-o pela primeira vez, e com justificada ansiedade, na voz de Léo nas noites de sábado. Era o prenuncio do domingo de corrida que viria, com lances do treino, bastidores, o grid. Chateava com meus pais quando trocavam de canal ou não se calassem para ouvir os detalhes naquele tempo de poucos recursos de informação e muita imaginação.
Tal como Getúlio Vargas, no corre-corre entre os fios da Rádio Globo, Léo teve a pesada obrigação jornalística de dar o obituário de Ayrton Senna no pós-Imola, em ponte com Roberto Cabrini num agitado saguão hopitalar em Bologna.
O primeiro informe foi trajando uma camisa puxada para o laranja sem muita importancia. Ao aparecer mais tarde naquele domingo, estava vestindo preto e um broche de um capacete, dado de presente pelo próprio Senna tempos antes e que fez questão de destacar no ar.
Mas, admito, soa simples demais lembrar apenas deste momento que, ultimamente, soa até como moda recordar. Dentre os movimentos pioneiros de Léo na F1, talvez nem ele soubesse o tamanho da história que foi acompanhar, com certo extasio na voz, o malabarismo magistral de Gilles Villeneuve e Rene Arnoux no sobe-e-desce de Dijon-Prenois, em 1979.
O mal acostumado pode achar que a narrativa de Léo em momentos da F1 era um tanto quanto formal, protocolar e levemente “sem graça”. O estilo da época não era tão permissivo como hoje e, mesmo nos engravatados anos 1970, impossível era para ele conter a empolgação diante do troca-troca de posições e do arrojo do “piccolo canadese” sem querer entregar a segunda posição por várias voltas.
O brasileiro médio podia ter dado de ombros depois dos abandonos de Nelson Piquet e Emerson Fittipaldi durante aquela corrida, mas quem manteve a Colorado RQ ligada e as válvulas quentes até o fim da prova, com gosto de velocidade na boca, ganhou um prêmio totalmente traduzido em portugues por Léo e um pragmático Reginaldo nos apontamentos que fazia, alertando até pelo perigo dos toques.
Espetáculo, indescritível apenas delineando e coisa que nenhum poeta poderia fazer em linhas, e que talvez só mesmo Léo podia contar como ele contou lá no distante 1979. Tamanho extasio que, na concentração pelo próximo movimento da briga, o vencedor Jean-Pierre Jabouille virou detalhe. Um de tantos momentos e tantos derbies em pista que o moço de Cordeirópolis traduziu à nós e que, felizmente, ficou impresso na história com seu estilo e entusiasmo.
Entusiasmo que o levou até um domingo, na maior das ironias, para uma repentina despedida final. E dos que vivem velozes as esquinas da categoria e de tantos outros elementos da velociodade que nos cercam, a nossa gratidão por ser, de fato, a “voz marcante” inclusive a mais de 300 por hora e sem perder o estilo que eu, meus pais, tios e avós se acostumaram a ouvir o esporte.
Gratidão por tanto, Léo!
Apesar de não ser da minha época, ele apresentava a zebra do fantástico. Xiii deu zebra!
Sinal Verde eu parava o que estivesse fazendo para ver o programa.
Como não lembrar da sua voz marcante nos gols da rodada.
Imagino o quanto deve ter sido difícil informar a pe da do maior esportista que tivemos no Brasil.
Nossas referências infelizmente estão chegando ao fim… tudo tem começo, meio e fim. Que ele continue comentando lá de cima agora.
Até um dia Léo!
#rip